segunda-feira, 4 de abril de 2011

Dom Redovino Rizzardo, cs, Bispo de Dourados - MS



Quem sabe, faz a hora: não espera acontecer!

A canção de Geraldo Vandré apareceu em 1968, mas 42 anos depois, em Dourados, ela teve uma reinterpretação, através de três eventos altamente significativos.

O primeiro deles aconteceu no dia 21 de fevereiro de 2011, quando foi implantado o “Observatório Social de Dourados”. Ele integra a rede “Observatório Social do Brasil”, presente em mais de 100 cidades, destinado a pôr nas mãos do povo instrumentos que lhe possibilitem vigiar e aprimorar a atuação do poder executivo, legislativo e judiciário. Presente ao ato, dei o meu recado a quem me entrevistou: “O Observatório Social vem ao encontro de uma necessidade há muito esperada pelo povo. Votar não é suficiente; é preciso continuar participando: acompanhando e fiscalizando o que se refere à gestão da coisa pública”.

A fundação do “Observatório Social” foi seguida de mais duas iniciativas semelhantes. No dia 25, os índios de Dourados implantaram o “Observatório de Direitos Indígenas do Mato Grosso do Sul” (ODIN). Com a finalidade de promover os interesses culturais, jurídicos e econômicos dos povos indígenas, o novo organismo conta com a participação de advogados, lideranças políticas, associações culturais, professores e acadêmicos.

De acordo com o advogado e seu primeiro presidente, Wilson Matos da Silva, o ODIN Nacional já existe há dois anos, e tem sua sede em Brasília: “O ODIN do Mato Grosso do Sul quer ser o elo nas questões que envolvem disputas por terras no Estado, que, muitas vezes, resultam na criminalização de líderes indígenas». Para ele, é toda a sociedade brasileira que precisa se comprometer com a Constituição de 1988, para que seja assegurado aos índios o respeito à pluralidade e a seus costumes, usos, linguagem e crenças: «Para tanto, é necessário que a sociedade conheça os povos indígenas; é o que pretende fazer o Observatório de Dourados, contribuindo para a harmonia entre as partes”.

A data de 8 de março assinala o dia internacional da mulher. A forma encontrada por um grupo de mulheres indígenas de Dourados para celebrar a efeméride foi inovadora. No dia 5 de março, a imprensa local publicou a seguinte notícia: “As mulheres da Reserva Indígena de Dourados se uniram para dar um ponto final à miséria e à violência que cercam as aldeias. Mães, mulheres de todas as idades, elas querem aprender uma profissão e se tornar empreendedoras. Para isso, estão adequando a cultura local para atender o mercado de trabalho fora da Reserva. A fundação da “Associação de Mulheres Indígenas de Dourados” (AMID) foi o pontapé inicial. Através de parcerias, a Associação leva cursos profissionalizantes às índias. Muitas delas já querem montar o seu próprio negócio”.

Esclarecedoras as razões que motivaram as mulheres, assim sintetizadas por uma delas: “A mulher indígena não quer continuar dependente. Queremos trabalhar e conseguir dinheiro para manter nossa família, sem doação de ninguém. Queremos dignidade!». Outra colega da associação completou a dose: “Nossa cultura nos leva a ensinar os filhos a trabalhar desde cedo, ajudando o pai ou a mãe na lavoura e na comercialização do que é produzido na aldeia ou fora dela. Infelizmente, a lei diz que criança não pode trabalhar. O que sobra para elas? Muitas acabam nas drogas, na prostituição e na bebida”.

Não posso negar: fazia anos que eu esperava por essas iniciativas na sociedade douradense e, sobretudo, na comunidade indígena. Se o “Observatório Social de Dourados” veio despertar nos cidadãos uma força e um compromisso há tempo adormecidos, as associações indígenas expressam o grito de libertação de um povo que já não suporta um assistencialismo do Estado, cujo objetivo mais ou menos oculto parece ser mantê-lo distante e alheio ao desenvolvimento.

Estou convencido que, para preservar uma cultura tão rica em valores humanos como é a indígena, será necessário partir para novas formas de subsistência, que ofereçam aos índios os benesses indispensáveis de uma sociedade organizada, tais como a educação, a saúde, a moradia, o lazer e a segurança. Mas nada disso acontecerá – e a própria demarcação de terras não passará de ilusão e falácia – se a distribuição de cestas básicas não for acompanhada pela oferta de trabalho digno e de salário justo para todos. [CNBB]

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