“Depois
de tudo isso, derramarei o meu espírito sobre todos os viventes. E, então,
todos os filhos e filhas falarão como profetas...!” (Joel 3, 1ab).
“Vós
todos podeis profetizar...” (I Cor 14,31).
Amados
irmãos e irmãs, chamados que fomos para sermos e atuarmos como profetas nestes
novos tempos de Igreja, a paz e o amor de Jesus estejam com todos vocês!
Para
esta nossa Carta de junho, duas propostas nasceram na minha mente e
amadureceram longamente no meu coração. A primeira é uma reflexão sobre a
profecia na vida dos seguidores de Jesus, motivada pela celebração, neste mês,
de três grandes profetas: João Batista, cujo nascimento se comemora no dia 24 e
os Apóstolos Pedro e Paulo no dia 30. A segunda – como não poderia deixar de
ser -, é uma constatação motivada pelas atuais providenciais circunstâncias
históricas, uma nova primavera que vive a nossa Igreja Católica.
1.
Profecia e Profeta: anúncio, denúncia e os profetas de ontem e de hoje. Não é
muito clara a origem do termo “profecia”. Em todo o caso, sua conotação é a de
“oráculo”, anúncio ou, também, de advertência ou denúncia. O profeta usa ora
palavras de carinho e ternura, de promessas e de acolhida para os que observam
os mandamentos e normas divinas e andam pelos bons caminhos, ora emprega
palavras duras de ameaças e castigos terríveis para os que enveredam pelos
desvios e descaminhos contrários aos projetos divinos. Quanto à história da
nossa salvação, é bastante percorrer alguns dos 18 livros proféticos do Antigo
Testamento para que nos demos conta desse processo, digamos,
pedagógico-educativo do povo eleito. O profeta, aquele que vive intimidade com
Deus, é o encarregado por Ele para anunciar ao povo, ou o perdão e o abraço
divinos, ou os castigos merecidos pelos que se afastam das leis do Senhor. Isto
está em conformidade com o que se lê no Profeta Joel, citado acima. Por isso, é
provável que o nome “profeta”, como é empregado na Bíblia, signifique aquele
que fala como acreditado mensageiro do Altíssimo. Deve-se observar que nos
termos “profecia” ou “profeta” não há nada que implique previsão de
acontecimentos. Pode um profeta predizer, ou não, o futuro segundo a mensagem
que Deus lhe der.
Mas
– poderia alguém perguntar – porque esta introdução? Justamente para lembrar o
último dos profetas do AT, João Batista e os dois primeiros, Pedro e Paulo, sem
falar no profeta dos profetas, Jesus. E, é claro, para voltar a chamar nossa
atenção de discípulos missionários, profetas que deveríamos ser de nossos
tempos.
a)
João Batista, o último dos profetas do AT. “Em verdade, eu vos digo, entre
todos os nascidos de mulher não surgiu quem fosse maior que João Batista” (Mt
11,11). João foi o profeta corajoso, destemido que, de peito aberto, usa
palavras duras de denúncia e de ameaças de castigos às “víboras” – fariseus e
saduceus: “Víboras que sois, quem vos ensinou a fugir da ira que está para
chegar? Produzi fruto que mostre vossa conversão” ... O machado já está posto à
raiz das árvores. Toda árvore que não der bom fruto será cortada e jogada ao
fogo” (Mt 3, 7b; 8;10). Mas foi, sobretudo, o profeta do anúncio da conversão,
da preparação, da chegada e da presença de Jesus: “Convertei-vos, pois o Reino
de Céus está próximo. “É dele que falou o profeta Isaías: ‘Voz do que clama no
deserto: Preparai o caminho do Senhor, endireitai as veredas para ele’” (cf. Mt
3, 1-17). E vem agora o principal na vida de João Batista: ao avistar Jesus,
num alegre e indizível ímpeto profético, manifestando a razão de ser de sua
missão, exclama: “Eis o Cordeiro de Deus, aquele que tira o pecado do mundo. É
dele que eu falei: ‘Depois de min vem um homem que passou à minha frente,
porque antes de mim ele já existia’” (Jo 1,29-30).
Para
sua reflexão: a você, batizado, seguidor de Jesus, membro de comunidades e de
movimentos eclesiais (do Movimento de Cursilhos, por exemplo), pergunto: até
onde vai sua consciência de ser profeta de Jesus? Mais: até onde chega sua
coragem para – como João Batista – denunciar a hipocrisia, o erro, a maldade e,
sobretudo, anunciar que o “Reino já está no meio de nós?”, isto é, anunciar que
Jesus está vivo e presente na nossa cultura, na nossa sociedade que anda tão
distante Dele?
b)
Os santos Apóstolos Pedro e Paulo, primeiros profetas do NT. Primícias da Igreja pensada pelo Mestre e
iniciada com a primeira comunidade de homens e mulheres reunida ao seu redor,
são eles também os primeiros profetas do NT. Firmados, agora, no fato da
ressurreição de Jesus, assumem,
corajosos, a missão de sair pelo mundo anunciando a Boa Nova: “Ide pelo
mundo inteiro e anunciai a Boa Nova a toda criatura” (Mt 16,15). Eis que Pedro,
inflamado pelo Espírito Santo, superando o medo (cf.Jo 20,19) e enfrentando
“partas, medos e elamitas, habitantes da Mesopotâmia, da Judéia e da Capadócia,
do Ponto e da Ásia... (cf At 2,9-11), ao mesmo tempo que anuncia a pessoa de
Jesus, denuncia aqueles que mataram o mesmo Jesus: “Deus, em seu desígnio e
previsão, determinou que Jesus fosse entregue pelas mãos dos ímpios, e vós o matastes, pregando-o
numa cruz” (At 2,23). E o que dizer do espírito profético do convertido, o
judeu Saulo, depois Paulo? Em inúmeras ocasiões, em incontáveis escritos e
conteúdos de suas cartas, deixa muito claras as corajosas denúncias contra o
mau procedimento de muitos que, pelo seu próprio ministério, haviam abraçado a
fé cristã.
Para
sua reflexão: vivemos uma realidade que a todos nós, na maioria das vezes, nos
impede de sermos os profetas que deveríamos ser e que, se na vida de quase
todos os profetas e nos primórdios da Igreja era comum, nos dias de hoje, na
atual cultura do relativismo e da pressão social alimenta, até, uma certa
vergonha nos cristãos. Trata-se do medo. Medo de anunciar; mais, medo de
denunciar; medo de atitudes e gestos proféticos.... enfim, medo de se agir como
discípulo missionário de Jesus! Você também anda pressionado por este medo?
Esqueceu-se, meu caro profeta, minha querida profetiza, que foi Ele que disse:
“Não tenham medo?” E, então?
2.
Uma “nova primavera na Igreja Católica”. Somos cristãos católicos
privilegiados. Tenho certeza de que todos temos consciência de estar vivendo
novos tempos, novos desafios e novas perspectivas para a Igreja Católica.
Fala-se, até, numa nova primavera da Igreja. Como já o fiz na Carta do mês
passado, refiro-me, à eleição do Bispo de Roma (“o primeiro entre iguais”),
Francisco. Seus gestos, seus testemunhos pessoais estão a nos indicar claramente
uma nova postura para todos os católicos, para toda a Igreja. Não basta dizer
que a Cúria romana deverá ser reformada ou que este é o Papa de que precisamos,
etc. É urgentemente necessário que seu exemplo e testemunho atinjam a
mentalidade e a vida de toda a hierarquia da Igreja, bispos e sacerdotes,
religiosos e religiosas e de todos os
católicos. Do contrário, os exemplos de Francisco, cairão no vazio e, como diz
no título de um maravilhoso e profético artigo, um dos mais conhecidos teólogos
contemporâneos, Hans Küng, companheiro que foi de magistério do emérito Papa
Bento XVI: “Não deixem a Primavera virar Inverno”. Primavera na Igreja é
superar uma “Pastoral de mera conservação e sair para uma pastoral
decididamente missionária” (Cf Doc.370). SAIR é um dos verbos mais usado pelo
Papa Francisco. Igreja, comunidades, movimentos eclesiais devemos todos SAIR...
Por oportuno, aplicando-a, sobretudo, ao Movimento de Cursilhos, permitam-me
repetir uma comparação feita por Francisco ao afirmar que a Igreja deve sair
para a missão: Diante desta alternativa, quero dizer-lhes fracamente que
prefiro mil vezes uma Igreja acidentada do que uma Igreja doente. A doença
típica da Igreja fechada é a auto-referência; contemplar-se a si mesma, estar
curvada sobre si mesma como aquela mulher do Evangelho”.
Que
a intercessão de São João Batista e dos Santos Apóstolos Pedro e Paulo
juntamente com a de Maria, possa fazer com que criemos uma mentalidade cada vez
mais profética e missionaria, uma mentalidade de autênticos discípulos
missionários de Jesus, são os votos mais fraternos de
Pe.José Gilberto BERALDO
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