Cuidar da amizade é preocupar-se
com a vida, as penas e as alegrias do amigo e da amiga. É oferecer-lhe um ombro
quando a vulnerabilidade o visita e o desconsolo lhe oculta as estrelas-guias.
É no sofrimento e no fracasso existencial, profissional ou amoroso que se
comprovam os verdadeiros amigos e amigas. Eles são como uma torre fortíssima
que defende o frágil castelo de nossas
vidas peregrinas.
A relação mais profunda é a experiência do amor. Ela traz as mais felizes realizações ou as mais dolorosas frustrações. Nada é mais misterioso do que o amor. Ele vive do encontro entre duas pessoas que um dia cruzarem seus caminhos, se descobriram no olhar e na presença e viram nascer um sentimento de enamoramento, de atração, de vontade de estar junto até resolverem fundir as vidas, unir os destinos, compartir as fragilidades e as benquerenças da vida. Nada é comparável à felicidade de amar e de ser amado. E nada há de mais desolador, nas palavras do poeta Ferreira Gullar, do que não poder dar amor a quem se ama.
Todos esses valores, por serem os mais preciosos, são
também os mais frágeis porque mais expostos às contradições da humana
existência.
Cada qual é portador de luz e de
sombras, de histórias familiares e pessoais diferentes, cujas raízes alcançam
arquétipos ancestrais, marcados por experiências bem sucedidas ou trágicas que
deixaram marcas na memória genética de cada um.
O amor é uma arte combinatória de
todos estes fatores, feita com sutileza que demanda capacidade de compreensão,
de renúncia, de paciência e de perdão e, ao mesmo tempo, comporta o
desfrute comum do encontro amoroso, da
intimidade sexual, da entrega confiante de um ao outro. A experiência do amor
serviu de base para entendermos a natureza de Deus: Ele é amor essencial e
incondicional.
Mas o amor sozinho não basta. Por isso São Paulo em seu famoso hino
ao amor, elenca os acólitos do amor sem os quais ele não consegue subsistir e
irradiar. O amor tem que ser paciente, benigno, não ser ciumento, nem gabar-se,
nem ensoberbecer-se, não procurar seus interesses, não se ressentir do mal…o
amor tudo sofre, tudo crê, tudo espera e tudo suporta…o amor nunca se
acaba(1Cor 13, 4-7). Cuidar destes acompanhantes do amor é fornecer o húmus
necessário para que o amor seja sempre vivo e não morra pela indiferença. O que
se opõe ao amor não é o ódio mas a indiferença.
Quanto mais alguém é capaz de uma entrega total, maior e mais forte é o amor. Tal entrega supõe extrema coragem, uma experiência de morte pois não retém nada para si e mergulha totalmente no outro. O homem possui especial dificuldade para esta atitude extrema, talvez pela herança de machismo, patriarcalismo e racionalismo de séculos que carrega dentro de si e que lhe limita a capacidade desta confiança extrema.
A mulher é mais radical: vai até
o extremo da entrega no amor, sem resto e sem retenção. Por isso seu amor é
mais pleno e realizador e, quando se frustra, a vida revela contornos de
tragédia e de um vazio abissal.
O segredo maior para cuidar do amor reside no singelo cuidado da ternura. A ternura vive de gentileza, de pequenos gestos que revelam o carinho, de sacramentos tangíveis, como recolher uma concha na praia e levá-la à pessoa amada e dizer-lhe que, naquele momento, pensou carinhosamente nela.
Tais “banalidades” tem um peso
maior que a mais preciosa jóia. Assim como uma estrela não brilha sem uma
atmosfera ao seu redor, da mesma forma, o amor não vive sem um aura de enternecimento, de afeto e de
cuidado.
Amor e cuidado formam um casal inseparável. Se houver um divórcio entre eles, ou um ou outro morre de solidão. O amor e o cuidado constituem uma arte. Tudo o que cuidamos também amamos. E tudo o que amamos também cuidamos.
Tudo o que vive tem que ser
alimentado e sustentado. O mesmo vale
para o amor e para o cuidado. O amor e o
cuidado se alimentam da afetuosa preocupação de um para com o outro. A dor e a
alegria de um é a alegria e a dor do outro.
(retirado de Leonardo Boff.com)
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